Esta não é uma postagem para dar um tom pessimista à Vida. Ela é perfeita, mas as engrenagens, as relações, os ajustes, são, por vezes, complicados, emaranhados, nebulosos. Exigem de nós energia e dedicação redobrados.
Buscamos a felicidade, a realização, a plenitude. Amamos as plenitudes esquecendo que a Vida também é feita de faltas, de vazios, de angústias. Saber (con)viver por entre os vazios é aprendizado, é carpintaria. Um caminho inteiro de tentativas, autoconhecimento, intermináveis (e benditas) sessões de terapia e boas doses de lucidez. E em algum momento, humanos ("demasiadamente humanos") que somos, cansamos.
Nos é dado o sagrado direito ao cansaço, então, que seja para que possamos parar tudo o que estamos fazendo e (re)avaliar, (re)pensar, (re)ver os vazios que temos em nós. Os conhecidos e nomeados vazios e os que nem sabíamos que estavam lá. Admitir-se imperfeito é perdoar a si mesmo. Nas minhas imperfeições, cresço. Nos meus cansaços, apr(e)endo.
Há em mim um cansaço, "um supremíssimo cansaço. Íssimo, íssimo. íssimo , cansaço." Que eu saiba transformá-lo em força criativa e amorosa sem perder o encanto pelas plenitudes e nem sentir medo dos vazios.
CANSAÇO
"O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A sutileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas -
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,Cansaço..."
Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa.
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