Que horas são?

sábado, 4 de abril de 2015




O AMOR




"Chega de escrever
Sobre o amor
Como tenho feito,
Chega de trazer
a exaustão e a dor
ao peito machucado,
chega de esperar
fecundidade na
areia calcinada
Vou atrás de outro
assunto, de outro
sentimento menos
bruto e selvagem
do que o amor,
vou procurar
alhures
encontrar a
suavidade que o
amor não traz,
parto em busca
de uma outra
fome,
de uma outra
sede,
de um parto
de nova criatura
Vou à História,
à Geografia,
à Física,
à Química,
à Biologia
e a algum outro
saber humano
que bem maneje
malabares
dentro do tempo
e nalgum espaço,
há de haver um certo
entendimento
organizado pelos
estudiosos, pelos
lentes das universidades,
pelos gênios dos laboratórios,
pelo engenho humano
desde o princípio
de nós
E transito agora
entre livros,
nas vastas bibliotecas
dos eruditos,
dos sábios,
das pessoas de
imensa formação,
e abro todas as folhas,
e fecho todas elas
também,
porque são insípidas
e são cansativas
e são insensíveis,
e prossigo agora
a conversar com
esses homens todos,
alimentando minha
esperança de odiar o amor
porque nada me trouxe,
nada me deu
E nisso estou há muitos anos,
e caminho já fatigado
por todas as estradas
que conheci
depois que o amor
de mim desdenhou,
adoeceu meu coração
com sua doença
incurável,
e me trouxe todos
os custos,
todos os preços
e todas as quantias
que um pobre espírito
há de pagar
- e não pode pagar -
para sorrir
enquanto ama
e é amado
Eu sou sua vítima
e quero seu fim,
sua morte,
e pesquiso ainda
em bibliotecas
e consulto
homens de saber
para que me digam
como bem odiar
o amor,
e eles me dão conselhos
confusos
e me dão bússolas
que não quero,
palavras que desconheço
e fraternidade duvidosa,
não sabem falar do amor
e não sabem como odiar
o amor,
como eu odeio há tantos
anos,
desde que morri de amor
e fiquei insepulto
como um Polinice
sem Antígona,
e desde então
sobrevoam pássaros
mórbidos
sobre meu corpo
caído ao chão,
morto de amor
Mas eu,
depois de tanto tempo
buscando matar
quem me matou,
definindo meu
maior oponente
e planejando
fazê-lo sofrer
como a mim
ele fez,
eis que abro todos
os livros do mundo,
irrompo em todas
as bibliotecas
da Terra,
converso com
todos os eruditos
e todos os sábios,
todos os professores,
todos os antigos
preceptores,
e vejo que não há,
nem nos livros,
nem nas bibliotecas
e nem no coração 
dos homens de saber
um assunto que,
mesmo sendo
esse horrível
amor,
a ele supere
E é quando
então sinto a 
desesperação
de precisar seguir
com ele sobre mim
revoando,
de precisar cumprir
meus dias
com o amor na cabeça,
de aceitar
meu coração arrebentado
E depois, por fim,
definitivamente estafado
por tanta busca,
vem-me subitamente
a impressão
de que o amor
apenas me entrara mal
ao coração,
e que agora, se bem nele entrar,
será o que sempre
disseram os que não
consultei,
- eles, os poetas -
para tornar-se o
alimento da minha fome
e a água da minha sede,
e eu o perdoarei
porque não o
havia compreendido
diante da frágil
tessitura que o compõe,
da sofisticada essência
que possui
e das filigranas
- finas ourivesarias
da emoção -
que me contam que
“sem amor, eu nada seria”..."



Pedro Moacyr Pérez da Silveira, é professor de Filosofia do Direito, na Universidade Federal de Pelotas, Rio Grande do Sul. É meu amigo e escreve com a sensibilidade dos poetas.




terça-feira, 31 de março de 2015

O QUE ESPERAR DE UMA RELAÇÂO






"Que não tenha mentiras. Nem traição.

Que perceba o que gera ciúme, não se envaideça da insegurança, e procure esclarecer as dúvidas com firmeza.

Que proporcione segurança, sem falsos compromissos. Que o outro possa se ausentar com tranquilidade não precisando se preocupar se você está fazendo o que falou.

Que não exerça a cumplicidade do mal com os próximos, desmerecendo quem você ama.

Que não permaneça de conversa e flerte com ex e interessados, que não ache graça em realizar as coisas escondido, como se fosse mais esperto.

Que não crie juízo final em cada discordância.

Que feche o passado amoroso por respeito e não traga à tona o quanto já foi alegre e livre antes. Afinal, experiência que virou sabedoria é silenciosa.

Que não resvale em soberba e prepotência na hora de ouvir conselhos e aceite opiniões diferentes da sua.

Que respeite quem viveu mais e pode exemplificar dilemas.

Que não desmereça o significado de nenhum presente ou agrado.

Que entenda o senso de humor e a alegria de sua companhia.

Que participe do trabalho do outro.

Que faça demonstrações de como seu par vem sendo especial e decisivo em sua vida.

Que recorde os momentos de entrega e romance para nunca se distanciarem da paixão.

Que conte o que está pensando, antes de qualquer pergunta.

Que exponha seus gostos e não cobre adivinhação. E que não se insulte em repetir as preferências. Esquecimento nem sempre é desinteresse.

Que destaque o quanto prefere viajar a dois, para dividir as lembranças e somar as memórias.

Que organize férias e alimente expectativas.

Que não deboche pelas costas.

Que não repita as ofensas que mais doem numa discussão.

Que não agrida fisicamente por nada neste mundo.

Que os projetos sejam cumpridos e jamais abandonados. Pela insistência, diferenciamos o sonho do capricho.

Que jamais despreze o salário ou gaste algo sem a dimensão do esforço que custou.

Que as atividades planejadas diariamente, ainda que desagradáveis, não sejam canceladas.

Que não use dois pesos e duas medidas, que aquilo que peça também seja feito de sua parte.

Que abra espaço para o programa predileto do outro uma vez por semana.

Que prepare um jantar ou um café de surpresa para roubar risos.

Que conforte na doença e acalme na tristeza.

Que tire um dia no final de semana para preguiça da conchinha e da tevê.

Que participe das contas, do planejamento da casa.

Que festeje as virtudes do outro com os amigos e que exponha, reservadamente, os defeitos que incomodam.

Que combata as injustiças com ardor.

Que agradeça as gentilezas retribuindo com novas gentilezas.

Que não incentive intrigas e procure aproximar os familiares.

Que todas essas regras sejam espontâneas e esquecidas dentro da felicidade. Pois apenas existe um jeito de amar que dá certo: quando amamos com caráter."


(Fabrício Carpinejar)