Que horas são?

sábado, 24 de agosto de 2013



Graça Borges é minha amiga. Nosso encontro é sempre festa, boas risadas, algumas confidências e muita leveza. Graça é bonita, inteligente e intensa. Por inacreditável, é mãe de quatro filhos, entre adolescentes e adultos. Em sua jornada, entre caminhos, desistiu de buscar na formação acadêmica o que estava dentro dela. E em um momento de desconstrução pessoal, voltou-se para o mosaico - o que surge depois de ser.
A arte pedia passagem, latente na alma. Inicialmente, Graça utilizou as pastilhas de vidro, buscou a cerâmica e, atualmente usa materiais italianos como o Smalti Orsoni, de Veneza e o Milifiore, compondo uma obra dinâmica, forte e atemporal. Sei que o mosaico não resume a sua obra, por que Graça é inquieta. 
Para celebrar, vai expor seus trabalhos, junto com a artista plástica Rachel Grinberg, no período de 11 a 30 de setembro, na Artes & Ofício Zona Norte, em Pelotas.











Frida Kahlo é sua inspiração. Em um dos nossos encontros, com outras amigas queridas, Graça mostrou uma imagem de Frida e determinou: "Será minha próxima criação, em mosaico!" Alguns meses depois, ela cumpre a palavra.
Bendita, Frida! Bendita, Graça!
Bendita, Arte!








"...na saliva. no papel. no eclipse. Em todas as linhas em todas as cores em todos os jarros em meu peito fora. dentro. no tinteiro - nas dificuldades de escrever no assombro de meus olhos, nas últimas linhas do Sol (o Sol não tem nenhuma linha) em tudo. Dizer "em tudo" é idiota e magnífico DIEGO em minha urina DIEGO em minha boca - em meu coração e minha loucura. em meu sono - no papel mata-borrão - na ponta da caneta nos lápis - nas paisagens - na comida - no metal - na imaginação. Nas doenças - nas vitrines - em suas lapelas - em seus olhos - em sua boca. em sua mentira. "

Frida Kahlo










SERVIÇO:



quinta-feira, 22 de agosto de 2013

                       (do que vejo por aí...)



Como é que se Esquece Alguém que se Ama?


"Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa - como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já lá não está? 
As pessoas têm de morrer; os amores de acabar. As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar Sim, mas como se faz? Como se esquece? Devagar. É preciso esquecer devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas! É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração. Ninguém aguenta estar triste. Ninguém aguenta estar sozinho. Tomam-se conselhos e comprimidos. Procuram-se escapes e alternativas. Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguem antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma. A saudade é uma dor que pode passar depois de devidamente doída, devidamente honrada. É uma dor que é preciso aceitar, primeiro, aceitar. 
É preciso aceitar esta mágoa esta moinha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo e que nos dá cabo do juízo. É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução. Quantos problemas do mundo seriam menos pesados se tivessem apenas o peso que têm em si , isto é, se os livrássemos da carga que lhes damos, aceitando que não têm solução. 
Não adianta fugir com o rabo à seringa. Muitas vezes nem há seringa. Nem injecção. Nem remédio. Nem conhecimento certo da doença de que se padece. Muitas vezes só existe a agulha. 
Dizem-nos, para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguimos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar. Fica tudo à nossa espera. Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado. 
O esquecimento não tem arte. Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a dobrar. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar. "


Miguel Esteves Cardoso, in 'Último Volume'




terça-feira, 20 de agosto de 2013







Mais Uma



"Entre teus olhos perfeitos me é de direito cantá-los assim
Entre teus braços, espaços, me cabe um cantinho guardado pra mim

E agora faz frio
E agora não tem mais você colorindo a manhã

Entre tua boca, teus dentes, me é de presente teu riso marfim
Entre teus pelos, espelhos, me refletem mil pedacinhos de mim

E agora faz frio
E agora não vem mais você, não existe amanhã
Pode ser nunca
Amanhã vê se me pergunta
Se não eu desmonto, não sigo, eu tombo
Amanhã pode ser uma
E mais uma e mais uma"





Sinto uma tristeza infinita quando penso sobre este assunto. Havia um tempo em que os relacionamentos tinham início, meio e, eventualmente, fim. E o fim era decretado quando esgotadas todas as possibilidades, ditas todas as palavras, podíamos, na maioria das vezes, elaborar a perda e, refeitos, seguir em frente. Há algum tempo, as pessoas foram perdendo a capacidade de cultivar as relações, e o mais novo e mais fácil, substitui, rapidamente, a relação anterior. Também a coragem perdeu-se, no caminho. Coragem para enfrentar os obstáculos, coragem para ficar, coragem para ir embora, com a mesma dignidade que chegou.
E a infelicidade, fruto da nossa incapacidade de assumir o que queremos ou quem desejamos que esteja ao nosso lado, pauta a vida que escolhemos viver.

"A infelicidade é uma questão de prefixo.", escreveu, sabiamente, Guimarães Rosa.



INFIÉIS DA PRÓPRIA VIDA

"Nossa vida está perdendo consistência. Espessura. Segurança. Estamos mais sujeitos a mudar do que a insistir.

Estamos mais sujeitos a nos separar do que a permanecer casados.

Estamos mais sujeitos a ir embora do que a voltar para casa.

O mundo está tomado de mutantes, zeligs, camaleões, transformers.

Se algo incomoda, se algo atrapalha, o botão Desapego é rapidamente acionado.

Como não pretendemos sofrer, caminhamos para a total insensibilidade. Deixa-se o começo por outro começo. Não há mais meio ou fim, o que vigora é a desistência.

Substituímos a responsabilidade pela ideia de liberdade.

Experimentar é a lei – fazer patrimônio e futuro não tem sentido.

Anteriormente, nos dedicávamos à família. Agora, nossa obsessão é o prazer pessoal. Danem-se as complicações.

A aparente leveza se assemelha a desenraizamento.

Buscamos chegar logo, não olhar a paisagem. A velocidade é o que nos provoca. Buscamos desembarcar logo num novo destino, não nos vale a estrada. A viagem deve ser curta e indolor, jamais reflexiva e longa.

Não estou sendo dramático. Na infância, tínhamos três canais de tevê. Hoje, são mais de 300. A variedade nos conduz a não nos fixarmos em nada durante grande tempo.

Ter um romance longo é quase uma insanidade, assim como ler um livro de 400 páginas ou assistir a um filme de três horas.

Não oferecemos chance para permanência, para a rotina, para a confirmação das expectativas.

Não toleramos o desgaste, o tentar o possível antes de se despedir. Sacrifício e renúncia são expressões banidas do vocabulário, significam burrice. “Perder tempo com alguém, com tanta gente interessante por aí?” é o que nos dizem.

O oi já é um convite, o tchau já é um adeus, não existe relacionamento seguro e firme que suporte a tempestade de contradições.

São muitos apelos para biografias imaginárias. São muitas opções de ser diferente, que nem descobrimos quem somos.

É sempre alguém nos chamando no Facebook ou nas redes sociais com uma história incrível, extraordinária, afrodisíaca, que é um crime não provar.

É sempre alguém oferecendo conselhos, dicas, sugestões.

Repare. O mundo virou sábio de repente: todos têm soluções, ninguém mais convive com seus problemas.

Não me refiro à infidelidade amorosa, mas ao quanto somos infiéis com o nosso passado.

Não é trocar de parceiro ou parceira, mas trocar de tudo: largar emprego, cidade, amigos, esportes, manias.

Troca-se de mentalidade mais do que de opinião.

E é tão fácil descartar, difícil é refinar a própria vida.

Mas se você concluiu a leitura desta crônica, ainda há esperança.

Esperança de não virar a página por um momento."


Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, p. 2, 20/08/2013

Porto Alegre (RS), Edição N° 17528


domingo, 18 de agosto de 2013








     
"Eu cuspo nescafé e você chora leite
De manhã
Amarro o meu sapato
E tu veste o sutiã

Cadê o nosso amor? me diz onde
Vou correndo pegar o bonde
Que linha liga o teu coração ao meu?

Almoço minha angústia
E tu ri com a cara na tv
Eu tomo um conhaque
E tu fala em ter bebê

Remenda o meu sorriso e, sorrindo,
Me costura mais uma ruga
Desfaz a casa que casa com o meu botão

Me esqueço em pensamentos
E tu cobra um pouco de colchão
Respondo qualquer coisa
E tu solta a minha mão

Coloca teu calor na estante
Vem, se deita tranquila e dorme

Em que sonho eu sonho meu sonho igual ao teu?

Que linha liga o teu coração ao meu?
Em que tronco encontro talhado o meu nome e o teu?

Em que sonho eu sonho o meu sonho igual ao teu?

O meu coração ao teu, teu nome talhado e o meu
meu sonho, meu sonho."




No fim de semana anterior, fiquei hospedada na casa da minha amiga Ana Lúcia, em Pelotas, por ocasião do seu aniversário. A casa da Ana tem alma!
Em uma tentativa de agradecer a hospedagem amorosa que recebi, fotografei muitos cantinhos da casa e mandei as fotos pra ela, que transformou em postagem em seu blog. 


Meu olhar sobre a casa da Ana Lúcia