Há pouco descobri a música da Skye Edwards. Uma voz perfeita para melodias intimistas e quase sempre delicadas. Todas as notas ficam bem na voz desta cantora britânica, nascida Shirley Klaris Yonavieve Edwards. Música da melhor qualidade.
Outra descoberta não tão recente, mas igualmente encantadora foi a poesia da Gilka Machado. Poesia visceral e considerada "imoral" para a época que foi escrita, Gilka da Costa Melo Machado nasceu a 12 de março de 1893, no Rio de Janeiro. Logo, uma mulher à frente do seu tempo, que escrevia sem medo sobre o desejo e o amor.
Humberto de Campos dizia "que sua rima cheirava a pecado", confirmando que ela dava voz à livre expressão erótica feminina. Quando li os primeiros poemas, não conseguia situá-la no início dos anos 1900, parecia uma escritora contemporânea, mulher independente, analisada, cheia de si. Engano, Gilka nasceu em outro século, mas foi uma mulher atemporal, que questionava a realidade da sua época e trazia à tona os desejos mais escondidos de cada mulher. Faleceu aos 87 anos e deixou sua poesia em
Gilka Machado – Poesias Completas.
Trouxe alguns dos poemas para compartilhar aqui no blog. Um encantamento sem fim...Uma inspiração para viver bem o feminino.
Teus olhos me olham
longamente,
profundamente,
imperiosamente...
De dentro deles teu amor me espia.
Teus olhos me olham numa tortura
de alma que quer ser corpo,
de criação que anseia ser criatura.
Tua mão contém a minha
de momento a momento:
é uma ave aflita
meu pensamento
na tua mão.
Nada me dizes,
porém entra-me a carne a persuasão
de que teus dedos criam raízes
na minha mão.
Teu olhar abre os braços,
de longe,
à forma inquieta de meu ser;
abre os braços e enlaça-me toda a alma.
Tem teu mórbido olhar
penetrações supremas
e sinto, por senti-lo, tal prazer,
há nos meus poros tal palpitação,
que me vem a ilusão
de que se vai abrir
todo meu corpo
em poemas.
SAUDADES
De quem é esta saudade
que meus silêncios invade,
que de tão longe me vem?
De quem é esta saudade,
de quem?
Aquelas mãos só carícias,
Aqueles olhos de apelo,
aqueles lábios-desejo...
E estes dedos engelhados,
e este olhar de vã procura,
e esta boca sem um beijo...
De quem é esta saudade
que sinto quando me vejo
(in Velha poesia, 1965)
ESBOÇO
Teus lábios inquietos
pelo meu corpo
acendiam astros...
e no corpo da mata
os pirilampos
de quando em quando,
insinuavam
fosforescentes carícias...
e o corpo do silêncio estremecia,
chocalhava,
com os guizos
do cri-cri osculante
dos grilos que imitavam
a música de tua boca...
e no corpo da noite
as estrelas cantavam
com a voz trêmula e rútila
de teus beijos...
(in Sublimação, 1928)
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