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sexta-feira, 20 de junho de 2014

Amor & sexo em tempos de Copa



[ Xico Sá e sua sensibilidade para narrar a Vida. Este é um texto sobre "amor nos tempos da Copa", mas reflete, com clareza, os descaminhos do amor nos dias comuns. ]



"Na festa da Copa, o “a gente se vê”, tema recorrente aqui neste blog, se torna mais grave ainda.


A fuzarca ludo-etílica pode até estimular novos possíveis casais, promover bons encontros, flertes, namoricos, rapidinhas…

Sem se falar nas ficâncias globalizadas em geral –os argentinos e holandeses, por exemplo, estão em alta com as gazelas na cidade do Rio de Janeiro no momento.

O xodó de Copa, nacional ou estrangeiro, é o maior festival de “a gente se vê”de todos os tempos.

Nada fica, nem o amor daquela rima antiga.

Fica tudo na base do “a gente se vê”… E adeus!

Não que fosse acontecer um casamento ou algo do gênero a partir daquele encontro, nada disso, mas foram encontros bonitos, fortes, que se acabam ali mesmo, na poeira da estrada, numa tarde fria, em um café da manhã, numa simples despedida.

Óbvio que o mês da Copa só amplia um sintoma moderno da época.

Homens e mulheres vivem hoje a arte do desencontro, com ou sem a festa futebolística.

“A gente se vê.” Pronto, eis a senha para o terror, o “never more”, o nunca mais do corvo do escritor Edgar A. Poe.

A gente se vê. Corta para uma multidão na avenida Atlântica, ai de mim Copacabana.

A gente se vê, corta para uma manifestação na avenida Paulista, com ou sem vândalos, com caras limpas ou mascarados, mas sempre com o gás lacrimogêneo para aumentar o chororô do cronista.

A gente se vê. Corta para uma saída de Castelão ou Mineirão lotadose.

A gente se vê. Corta para “onde está Wally”.

De um casinho de Copa, tudo bem, acontece, faz parte do jogo.

Na normalidade dos dias, porém, nada mais detestável de ouvir do que essa maldita frase. Logo depois a porta bate e nem por milagre.

Jovens mancebos, evitem essa sentença mais sem graça. Raparigas em flor, esqueçam, esqueçam.

Melhor dizer logo que vai comprar cigarro, o velho king size filtro do abandono. Melhor dizer que vai pra nunca mais. Melhor o silêncio, o telefone na caixa postal, o telefone desligado, o desprezo propriamente dito, o desprezo on the rock´s.

A gente se vê uma ova. Seja homem, troque de palavras, use o código do bom-tom e da decência. A gente se vê é a mãe, ora, ora.

Como canta o Rei, use a inteligência uma vez só, quantos idiotas vivem só…

Esse “a gente se vê” deveria ser proibido por lei. Constar nos artigos constitucionais, ser crime inafiançável no Código Penal. Alô STF, homens de toga, ponham na pauta.

A gente se vê é pior do que a gente se esbarra por ai. Pior do que deixar ao acaso, que jamais abolirá a saudade, que vira uma questão de azar e sorte.

Melhor dizer logo “foi bom, meu bem, mas não te quero mais”. YO NO TE QUIERO MAS, como na camiseta mexicana que ganhei de una hermosa chica. Dizer foi bom meu bem e pronto, ficamos por aqui, assim é a vida, sempre mais para curta do que longa-metragem.

A gente se vê é a bobeira-mor dos tempos do amor líquido e do sexo sem compromisso. A gente se vê é a vovozinha, ora!

Seja homem, seja mulher, diga na lata.

Não engane a moça, que a moça é fino trato, que não merece desdém.

A fila anda, jogue limpo.

A gente se vê. Corta para uma multidão no show do Morumbi. A gente se vê. A gente se vê. Corta para a multidão no Campo de Marte. A gente se vê. Corta para o formigueiro do Maracanã. A gente se vê. Corta para a São João com a Ipiranga. A gente se vê. Corta para um engarrafamento gigante na marginal do Tietê…


A gente se vê. Então aproveita e vai olhar se eu estou na esquina!"

XICO SÁ 



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